quarta-feira, 3 de junho de 2009

SONORO SILÊNCIO (FILME)

SONORO SILÊNCIO (FILME)

Samuel Hermínio fez um papel que poucos se dispõem a fazer em Paulo Afonso: o de agitador cultural. Pouco (ou nenhum) ganho financeiro, muito trabalho e apenas um pouco de prazer ao ver o serviço realizado. Há alguns meses ele lançou a revista “xicocultura” com textos de autores locais e com um VCD com vídeo-clipes, entrevistas e reportagens. Apenas duas edições saíram. Às sextas-feiras ele organizou encontros com bandas da cidade abrindo espaço e valorizando muita gente nova na música. Agora Samuel uniu-se a Edson “Chuck” e mais alguns amigos e fez o filme “Sonoro Silêncio”.
A idéia veio de “Chuck”, não por acaso também vocalista de uma banda local, a “Chuveiro Elétrico”. Ele imaginou a história de um garoto pobre, sonhador e esquizofrênico. Um triplo azar. Seu grande sonho é montar uma banda de rock e tocar sua guitarra. Um sonho não pouco comum em garotos de hoje em dia. Com um diferencial: ele não tem guitarra e não sabe tocar. É clara a inspiração de “Chuck”, a história é uma metáfora inspirada nele próprio (pobre, sonhador e vocalista de banda) e em muitos semelhantes locais ou distantes de Paulo Afonso. A presença da esquizofrenia ajuda a criar no personagem os tons absurdos necessários para as características irônicas da história. Todo mundo sabe que não é preciso uma doença mental para tornar difícil a vida de um músico pobre, mas está claro que a arte precisa do absurdo para ser interessante.
Ao tomar conhecimento da idéia de “Chuck” Samuel começou a escrever o roteiro (um excelente roteiro). Imaginou personagens e pessoas reais que pudessem interpretá-los e planejou as gravações. Para isso teve a ajuda do amigo Bosco, isso mesmo o nosso mais requisitado comediante. É ele o cinegrafista principal.
“Chuck” interpreta Astrobaldo, o personagem principal e o próprio Samuel interpreta dois frutos do delírio dele: Jorge e “sei não”. O pobre rapaz é jornaleiro e o patrão dele (Edclécio, interpretado por Aristóteles Santana) é um sujeitinho chato, pão-duro e insuportável. O filme narra a história de Astrobaldo e seus dois amigos imaginários tentando montar a banda imaginária que fará tanto sucesso. No quarto dele a foto do “Lord da guitarra”, um delírio representando os ídolos do rock and roll e várias fotos de músicos e bandas locais: Saulo, Caffeine Queen, Hatend, Pretérito Perfeito, Metal Wizard, etc. Nomes que se forem temporários já têm registrado neste filme seu passaporte para a eternidade.
Uma das melhores “sacadas” de Samuel foi justamente que não se faz um filme sobre um jovem rockeiro sem uma trilha sonora de rock and roll. Mas como fazê-lo em um filme alternativo de parcos recursos? Simples, pedindo permissão às bandas locais para usar suas músicas. É por isso que em uma das melhores cenas vemos a vocalista (que é muda) da banda de Astrobaldo dublando uma belíssima canção da Caffeine Queen.
O filme, claro, tem seus problemas. Boa parte do elenco não é formada por atores profissionais, o que comprometeu a qualidade do trabalho. Apenas a reconhecida e experiente Hellen (que faz o papel hilário da paixão de Astrobaldo) é atriz profissional, além de Bosco que faz uma ponta. Também o áudio é comprometedor. É necessário entender que Samuel teve que trabalhar com os recursos técnicos e humanos à sua disposição e que a ousadia de fazê-lo já é uma virtude. Mas o filme tem seus pontos positivos: o roteiro é excelente, os efeitos especiais também e Samuel revelou-se um competente diretor e editor.
Samueel já havia trabalhado com vídeo quando adaptou meu conto “A cidade” para curta-metragem. Este “Sonoro Silêncio” é seu primeiro longa (cerca de uma hora e dez minutos). Ele está neste momento de partida porque quem faz arte nesta cidade é que nem prego: nasceu para levar pancada na cabeça. O que todos esperamos é que para onde ele vá continue com seu processo de aprendizagem de fazer cinema (aqueles que o criticam sempre se esquecem que é um processo de aprendizagem), e que nos brinde no futuro com outros trabalhos.

Aristóteles Lima Santana.