quinta-feira, 22 de março de 2012

ARTIGO SOBRE O TEMA DAS ELEIÇÕES

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O Tema da Eleição

Em todo ano eleitoral, mais cedo ou mais tarde, a imprensa repete uma velha pauta: editores, repórteres e colunistas põem-se a procurar “o tema” da eleição.

Parece que acreditam que é possível identificar um único assunto, uma só preocupação, que os eleitores do país inteiro - ou uma proporção majoritária deles - compartilhariam. Como se houvesse alguma coisa, minimamente relevante, que os mais de 135 milhões de brasileiros em condições de votar possuíssem em comum.

Fora as generalidades mais triviais (amam o Brasil, desejam a felicidade, querem o melhor para seus filhos, e coisas do gênero), são muito diferentes. Trabalham em coisas diferentes e ganham quantidades de dinheiro completamente diferentes. Moram em lugares diferentes, de favelas paupérrimas a bairros de alto luxo. Muitos são jovens, outros idosos, e têm necessidades diferentes.

Diferem em outro aspecto fundamental. Além das segmentações socioeconômicas que existem na sociedade brasileira, nosso eleitorado está, crescentemente, dividido em termos políticos.

É verdade que não é grande a parcela com declarada e firme identidade partidária. Mas está longe de ser inexpressiva a proporção dos que se dizem simpatizantes de algum partido, dentre os quais se destaca o PT (que tem, sozinho, mais que o dobro da soma dos demais).

À medida que o tempo passa, essa simpatia tende a deixar de ser algo tênue ou puramente atitudinal. Ao longo dos anos, o eleitor começa a traduzi-la em comportamentos eleitorais concretos, renovando seu voto em sucessivas eleições. Com isso, seus vínculos com o partido - ou determinada liderança - se estreitam e consolidam.

Surgem, assim, eleitores petistas, peessedebistas, peemedebistas e por aí vai. Talvez não estejam inscritos em um cadastro qualquer (como acontece, por exemplo, nos Estados Unidos, onde a maioria do eleitorado tem uma identidade partidária “oficial”), mas isso não os torna menos entusiasmados na defesa de “seu” partido - e de “seus” candidatos -, ou menos previsíveis em suas escolhas.

Faz algum sentido imaginar que uma idosa pobre do interior, admiradora de Lula e do PT, e um jovem rico metropolitano, antipetista e admirador do PSDB, tomam suas decisões eleitorais da mesma maneira, em função de um mesmo “tema”, de uma só agenda?

A pergunta é ainda menos razoável em ano de eleições municipais. Nelas, achar que existe algo semelhante a esse hipotético “tema” apenas mostra desconhecimento a respeito de nossos eleitores.

É possível que, em condições excepcionais, existam eleições tão dominadas por um assunto que as diferenças objetivas e políticas do eleitorado se tornem secundárias. Se o país está frente a uma ameaça externa, se atravessa uma crise econômica, “o tema” da eleição é óbvio.

Isso aconteceu conosco na saída da ditadura e da hiperinflação. E deve ter sido então que nossa imprensa adquiriu o hábito de buscar “o tema” das eleições, mesmo quando ele não existe.

Em uma eleição municipal, como a que faremos este ano, é até difícil imaginar qual poderia ser. São milhares de candidatos a prefeito e vereador, em quase 5,6 mil cidades, que vivem realidades completamente diferentes. Os eleitores os escolhem levando em conta inúmeros aspectos - embora sempre acreditem que votam nos mais qualificados (dentre os que conhecem).

Faz parte da normalidade democrática e do amadurecimento político que a eleição municipal seja municipal, a estadual seja estadual, e que a nacional seja nacional. Poucas pessoas, hoje em dia, se confundem com isso.

A imensa maioria dos eleitores não define seu voto local em função de questões nacionais, e nem entenderia se alguém perguntasse que “recado” pretende mandar para Brasília ou a capital de seu estado. Para o cidadão normal, seria absurdo votar em um candidato a prefeito (ou a vereador) sabidamente inferior a outro, apenas para enviar uma esdrúxula mensagem - que ninguém, aliás, decifraria.

Pode dar mais trabalho, mas, ao invés de tentar encontrar “o tema” da eleição de outubro, os analistas fariam melhor se tentassem identificar os muitos temas que serão discutidos nas cidades brasileiras.

Marcos Coimbra é sociólogo e presidente do Instituto Vox Popul

Fonte: Blog do Noblat

quarta-feira, 14 de março de 2012

A GREVE DA PM NA BAHIA

A GREVE DA PM NA BAHIA

No início de fevereiro a Bahia foi surpreendida pela greve dos policiais militares. As notícias que nos chegaram sobre Salvador e região metropolitana foram de aumento da violência e do número de assassinatos. O carnaval de Salvador, uma fonte gorda de renda para a burguesia baiana, ficou ameaçado. Os policiais em greve chegaram a ocupar a Assembleia Legislativa da Bahia, onde ficaram sob cerco de tropas federais durante vários dias. Uma situação perigosa. Gravações secretas divulgadas pela mídia denunciaram que Prisco (um dos líderes) articulava ações violentas de grande impacto. Também ficamos sabendo de uma articulação nacional de greves militares para pressionar a aprovação de PEC 300, medida que elevará, caso aprovada, a média salarial dos servidores militares no Brasil.

Já se tornou comum relembrar que o governador Wagner em 2001, quando ainda deputado, apoiou a então greve da PM, assim como dava apoio às greves dos professores baianos. Sim, é uma grande contradição, mas não é a única e nem a maior. O governador criminalizou a greve dos policiais com o argumento das supostas ações de vandalismo, mas na última greve dos professores ele também ameaçou colocar na cadeia o senhor Rui Oliveira, presidente da APLB, sem que os professores em greve tenham esboçado um mínimo de violência na época. A criminalização dos movimentos sociais parece ser a tônica do governador, tanto faz se a greve é feita por policiais ou não.

O governador Wagner argumenta que o orçamento do Estado não suporta aumentos salariais consideráveis para os servidores públicos. Sabedor deste problema deveria então o governador criar políticas para aumentar a arrecadação do Estado e, assim, sanar as dívidas com servidores e investir mais na área social. Mas o que fez Wagner? Todos sabem que a fábrica da FORD instalou-se na Bahia no início da década passada com incentivos fiscais que comprometeram o orçamento do Estado. Tudo bem, este foi um erro de FHC e ACM, mas o que você não sabe é que em 2009 Wagner pressionou Lula para que estes incentivos, que terminariam em 2011, fossem prorrogados até 2015. E foi feito. A Bahia e o Brasil perdem três bilhões de impostos anuais para que a FORD mantenha dois mil empregados em Camaçari. Tal soma, se arrecadada pelo Estado, daria para não só aumentar a massa salarial dos servidores, como também aumentar investimentos na saúde e educação do Estado.

Alguns argumentam que a vinda da FORD com os incentivos fiscais foi boa, pois trouxe empregos e desenvolvimento. Pura falácia tola. Montadoras modernas de automóveis são robotizadas. Poucos trabalhadores, poucos empregos. As revendedoras ? Poucas contratações. O PIB baiano aumentou com a vinda da FORD, mas sem os impostos o Estado e o povo não ganham nada. O desemprego em Salvador e área metropolitana continuou alto mesmo depois da instalação da dita fábrica.

O problema com as reinvidicações dos servidores públicos é realmente orçamentário, mas Wagner não só não resolveu o problema, ele também piorou a situação. O que sobra é o Estado partir para a repressão sobre os trabalhadores. Aliás, Wagner já quer comprar outra briga, agora com os professores. É bom lembrar que a greve da PM é mais preocupante para ele do que uma na educação pública. Professores do Estado ensinam jovens pobres, já a falta de segurança atinge os ricos comerciantes que podem ser assaltados. Por isso a greve da PM durou menos tempo que a última greve dos professores.

Wagner e Lula, e antes deles FHC e ACM, facilitaram a vida financeira da FORD (segundo reportagem da ISTOÉ Dinheiro a fábrica da FORD na Bahia teria inclusive salvado a empresa da bancarrota) e prejudicaram a arrecadação do Estado. Será que fizeram isso “de graça”? Termino com este questionamento. Perguntar ou pensar sobre o assunto não ofende. Pensar é bom de vez em quando.

Aristóteles Lima Santana, 26/02/2012.

terça-feira, 6 de março de 2012

A MÍDIA E AS GREVES

DIREITO DE GREVE

Mídia joga sociedade contra o funcionalismo

Por Sylvio Micelli em 28/02/2012 na edição 683

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A recente paralisação de policiais na Bahia reacendeu uma velha discussão sobre o direito de greve no funcionalismo público. O assunto, apesar de constar da Constituição Federal de 1988, ainda não foi regulamentado. O Congresso Nacional parece não querer entrar num tema que, particularmente, não vejo como controverso. Há até um projetoem tramitação no Senado Federal para regular a matéria, mas que só cerceia o direito de greve e é melhor nem comentar. E a mídia, por sua vez, sempre contrária a qualquer manifestação que balance o establishment, coloca a greve como um crime e joga a sociedade contra o funcionalismo.

Esta postura midiática tem dado certo, até porque a sociedade brasileira, exceto em alguns raros momentos, não tem por hábito lutar por aquilo que acredita ser justo. O brasileiro é, por excelência, um acomodado. Gosta de reclamar, chiar, encher o saco, ainda mais em tempos de petição e revoltas online. Tirar as nádegas da cadeira e ir à luta de fato, porém, não é um hábito tupiniquim porque cada um prefere cuidar de sua vidinha. Então, soa estranho para boa parte dessa mesma sociedade, que pessoas saiam às ruas para lutar por aquilo que acreditam. Geralmente, quem faz isso é motivo de piada ou transforma-se num criminoso terrível porque está “atrapalhando” as pessoas na sua rotina diária.

Isso seria diferente na Coreia do Sul, na França, ou até mesmo na Bolívia. Mas estamos no Brasil varonil e segue o jogo.

Mobilização do funcionalismo

Hoje, queiram ou não, a categoria mais mobilizada de trabalhadores é composta por servidores públicos. É muito difícil, diferente do que ocorria ao final dos anos 70, quando trabalhadores da iniciativa privada – especialmente metalúrgicos e bancários – saíam em greve. O capitalismo arrocha cada vez mais os salários e, sob essa mesma ótica do capital rentista, se você não quer trabalhar, há pelo menos cem pessoas em busca da sua vaga para ganhar o mesmo ou até menos do que você ganha. Vejam, por exemplo, o caso dos países asiáticos onde há farta mão-de-obra e o capitalismo entende muito bem de economia. Se há muita oferta de mão-de-obra, podemos pagá-la o mínimo possível porque alguém, ainda que seja por mera subsistência, se sujeitará ao trabalho.

Voltando às greves do funcionalismo deixo claro que os exageros, que eventualmente ocorrem, devem ser combatidos. Isso porém, não desqualifica o conjunto de servidores grevistas e suas justas reivindicações. Tem outra coisa: ocupar a Assembleia Legislativa da Bahia ou qualquer outro prédio público, não é um desrespeito à sociedade. Feita de forma ordeira, a ocupação de um espaço público faz parte do jogo de xadrez que é uma greve.

Nos últimos 15 anos, o funcionalismo público, aqui ou alhures, tem lutado basicamente para repor as perdas inflacionárias e manter os poucos direitos que já lhe foram tirados pela chamada reforma administrativade 1998 e pelas duas reformas previdenciárias de 1998e 2003. Para que o trabalhador da iniciativa privada entenda, lutar por reposição salarial inflacionária equivale a lutar pelo cumprimento do dissídio coletivo e da data-base, comum ao setor privado e sempre cumpridos, mas que no serviço público, muitas vezes, não se cumpre sob as mais estapafúrdias desculpas.

A reposição salarial do funcionalismo, é bom assinalar, está na Constituição Federal, no Artigo 37, inciso X que determina reposição salarial anual para todos na mesma data e sem distinção de índices. Isso raramente é cumprido. E aí resta ir à luta. O que os policiais baianos fizeram foi colocar o governo na parede e denunciaram os baixos salários que os policiais recebem, o que, aliás, não é “prerrogativa” do estado da Bahia.

Hipocrisia da sociedade

Desde o início da greve, os noticiários colocaram os policiais como algozes da sociedade. O site UOL, por exemplo, contava o número de assassinados por falta de segurança nas ruas de hora em hora e colocava, claramente, que tudo aquilo acontecia porque os policiais estavam em greve. Mas não falava que eles exigiam o que lhes era devido. Se há um culpado para as mortes ocorridas na Bahia é o governo do estado e aí pouco importa se é o Jacques Wagner que está no poder ou se fosse qualquer outro. É algo impessoal. Possivelmente esses policiais entraram em greve, como último remédio diante do descaso de diversos governos, incluso o atual. É como uma radio ou quimioterapia para um doente terminal. A última medida, quiçá única.

Os demais veículos, denotando a massificação e hegemonização reinantes colocavam cenas de guerra, pavor e terror para que a sociedade nacional decretasse que aqueles policiais eram, de fato, criminosos. O importante era jorrar sangue. Mas, na verdade, ninguém foi, ou raros se perguntaram, quais os motivos da paralisação.

É comum também lermos e ouvirmos afirmações do tipo: “A greve é ruim porque prejudica a sociedade e deveria prejudicar o governador”. Tem ainda uma “ótima” na mesma linha. “As reivindicações são justas, mas o povo não pode pagar pela inoperância dos governantes”. Tem também o crítico que busca em outro emprego a solução do problema. “Se está ruim, vá fazer outro concurso e melhore seu salário”. As afirmações acima são tolas. E eu pergunto então, qual é o remédio? Que outra alternativa essas pessoas dão, quando alguém tem um direito que não lhe é pago e ela não tem outro recurso a não ser parar tudo?

Estado mínimo

Greve está aí para prejudicar mesmo, infelizmente, sem rodeios nem falsas ilusões. Se a sociedade fosse mais inteligente e lutasse efetivamente pelos seus direitos cobraria dos governantes que solucionassem o problema de imediato, até pelos altos tributos pagos e pela qualidade ruim dos serviços públicos que são prestados. Lembrando sempre que a culpa do serviço ruim não é do servidor. Se as escolas e os postos de saúde estão caindo os pedaços, se falta gente para atender, ou se o processo não anda no Judiciário é porque o Estado não investe o que deveria fazer, porque adota um modelo neoliberal e a política de Estado mínimo.

Para finalizar, li em algum lugar que não me lembro, e para reflexão, reproduzo a seguir: “Num momento de perigo, esquecemos Deus e chamamos a polícia. Passado o perigo, agradecemos a Deus e execramos a polícia...”

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[Sylvio Micelli é jornalista e servidor público]

Fonte: Observatório da Imprensa.