quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

O DIA EM QUE A TERRA PAROU, FILME DE 1951 (REPUBLICAÇÃO).

Este é um dos maiores cult movies da história do cinema. Um clássico da ficção científica que teve influência sobre a geração rebelde dos anos 60. A produção de 1951 conta a história de Klaatu, um viajante do espaço que vem à terra dar um aviso à humanidade sobre os perigos do poder nuclear. Na verdade um aviso e uma ameaça: ou a terra parava com as guerras ou ela seria destruida. Klaatu afirma que vem em nome de uma suposta confederação de planetas que vem monitorando a terra há muito tempo e que ficaram assustados com o recente domínio da energia nuclear pelo homem. Esta suposta civilização estelar considera a raça humana como primitiva e violenta e tem medo desta violência chegar até eles. Klaatu é um estranho pacifista: a paz deve existir mas sob a ameaça da destruição completa. Ele mesmo conta que Gork, o robô que o acompanha na viagem, representa uma raça de robôs policiais superpoderosos que garantem, sob a ameaça de destruí-los, que eles não lutem entre si. Assim eles evitam as guerras e orientam suas energias para outras atividades.
Um amigo meu alertou para a confluência do discurso de Klaatu e o de George W. Bush: o presidente dos EUA também vai ao Iraque e ao Afeganistão dizer a estes povos que eles são inferiores e que ou eles passam a viver numa "democracia" ou serão destruidos. Com a ressalva, claro, de que Klaatu não vem roubar nimguém e o grande interesse de Bush no Oriente Médio é passar a mão no petróleo dos árabes. O filme passa, evidentemente, uma visão pessimista da humanidade pois esta só poderia viver em paz sob ameaça e não por um processo dee evolução histórico-cultural. O curioso é que durante a guerra fria falou-se muito do "equilíbrio pelo terror", ou seja os EUA e antiga URSS tinham condições de destruir pela guerra nuclear a terra várias vezes e como um tinha medo do outro e da mútua destruição, acabavam evitando o confronto direto.
O filme também pode ser apontado como um sintoma da nossa cultura: a fixação nos discos voadores. Antes de Klaatu estrear no cinema já haviam os aficcionados por discos voadores e surgiam nos EUA vários depoimentos de contatos com extraterrestres, uma mania que se espalharia pelo mundo nos anos seguintes. A chamada ufologia espalhou-se e tem revistas especializadas, escritores que colhem dados sobre os supostos contatos, encontros internacionais, etc. O sucesso do seriado "Arquivo X" nada mais é que um espelho deste sintoma da cultura moderna.
No passado o homem ansiaava (e imaginava) contatos com seres vindos dos céus, os relatos antigos nos falam de supostos deuses, anjos e messias que traziam mensagens de paz (ou de guerra). A atual cultura dos discos voadores nada mais é que a transposição desta cultura antiga para moldes mais modernos. Como dizia Carl Sagan se estivéssemos na Antiguidade os supostos seres extraterrestres seriam deuses ou anjos, como estamos na era da ciência e das viagens espaciais os supostos deuses ou anjos viraram seres extraterrestres. Deus (ou deuses, ou anjos, ou messias) e Klaatu são personagens de um mesmo desejo humano: o de que "alguém" lá em cima nos observa e possa vir até nós trazendo uma mensagem que nos salve.
No filme Klaatu dá uma demonstração de força parando toda a energia da terra (como ele é bonzinho poupa os hospitais) por meia hora. Esta é a cena que dá título ao filme e que melhor define a missão de klaatu: fazer os seres humanos deixarem de ser peças da engrenagem do sistema por meia hora para que eles reflitam sobre sua missão. Talvez este seja o momento que mais encantou a geração dos anos 60 (Rita Lee dizia que encarnava Klaatu nos shows dos Mutantes e Raul Seixas tem um disco com o mesmo título do filme), momento em que o sistema é forçado a parar mediante uma força externa (sim, o que Klaatu faz é um atentado terrorista, embora não fira nimguém). O ideal de parar a "máquina" lembra um pouco o ideal anarquista da revolução pela greve geral.
Este filme é fruto da visão que uma parcela da humanidade tem de si mesma: um pessimismo sobre suas possibilidades de construir a paz universal e a esperança de uma resposta dos céus. Assisti-lo é compreender um pouco das ilusões humanas.

Aristóteles Lima Santana.

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